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O preço dos carros usados vai cair? Não!

Para a maioria dos modelos, tendência é estabilidade
21/09/2022

     Enxurrada nas locadoras, bolha no mercado, volta da produção. Se tu estas procurando carro e já comentou isso na roda de amigos, com certeza já ouviu pelo menos uma dessas três teorias para sustentar a tese de que o preço dos carros usados vai cair. Mas não é bem isso que a gente vê acontecer e não é exatamente isso que a gente acha que vai acontecer. 

     Vamos pelo terceiro argumento: a volta da produção nas empresas. De fato, com o fim das restrições da pandemia, as fábricas retomaram parte da sua produção. Mas elas ainda são afetadas pela guerra na Ucrânia e pelo abre e fecha na China, o que reduz a oferta de chips no mercado mundial. Além disso, as fábricas perceberam que elas podem produzir menos carros e ter o mesmo lucro. Como? Fazendo modelos de maior valor agregado. 

     Antes, todas as fábricas tinham um modelo barato, "de entrada", que vendia muito, mas com margem apertada de lucro. Em uma escala de produção, havia mais chance para defeitos e a montadora se incomodava com mais gente pedindo garantia. Agora, elas fabricam menos carros, melhores e mais completos. Assim podem cobrar mais por eles e ter menos dores de cabeça depois. A Chevrolet, por exemplo, não tem mais um modelo de entrada, como o Celta. Já parte do Onix, um degrau acima. 

     Aí vem o segundo argumento: o preço dos carros ficou mais caro porque aumentou a margem de lucro, o custo de produção aumentou, a matéria prima ficou mais escassa e a produção foi interrompida várias vezes. Não foi por especulação que os carros encareceram. Foi porque os carros novos ganharam equipamentos, cresceram em tamanho e hoje está mais caro produzir. 

     A retomada da produção até está deixando alguns modelos mais baratos no mercado de usados porque eles voltaram a estar disponíveis nas concessionárias. É o caso do Jeep Renegade, que já é possível encontrar nas lojas. O dono, por exemplo, de um 2018, versão Sport automática, tinha em junho um patrimônio de R$ 84.021 e agora o mesmo carro vale R$ 81.809 em setembro, segundo a tabela Fipe. Logo, o Renegade é um modelo que vai ficar mais barato nas lojas de usados. Mas não a ponto de voltar a preços de R$ 60, 65 mil, como chegamos a ver antes da pandemia.

     Por outro lado, quando a gente faz a mesma análise em um modelo como o Fiat Argo, o preço se mantém no mesmo patamar. A versão Drive 1.0 ano 2020 valia em junho R$ 61.001 na Fipe e agora em setembro vale R$ 60.550. Mas por quê? Porque as fábricas deixaram de fazer modelos de entrada e os que sobraram vão ser mais procurados daqui pra frente. Hoje, quem tem um Ford Ka não tem mais opção na Ford pra ter outro carro zero e se ele for buscar no mercado se seminovos, terá bem menos opções. 

     Com as fábricas abandonando o segmento de entrada, no futuro, não vai haver muita opção para que as pessoas possam trocar seus carros mais simples por outros, mais novos. Por isso, esses são os que não vão desvalorizar e, definitivamente, não vão voltar ao patamar anterior. Em 2017, eu vendi meu Gol Power 1.6 2010 por R$ 24 mil. Hoje a Fipe é R$ 28 mil e é difícil achar um bom por menos de R$ 30 mil nas lojas. Logo, quem tem esse dinheiro hoje está tendo que se contentar com modelos que já estavam fora do radar. 

     Por fim, o primeiro argumento: a tal enxurrada de carros nas locadoras. De fato, muitas delas estão trocando a frota agora. Mas é porque muitos pedidos atrasaram nas fábricas e estão chegando neste ano. Isso acontece de forma gradual, não de uma vez só. A venda do carro usado é o negócio da locadora e não a locação em si. Por isso, todo o mês, ela coloca carros à venda. E esses carros não são assim tão baratos. Eles são vendidos a preço de Fipe, na maioria das vezes. Logo, não serão eles que vão puxar os valores pra baixo.

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